terça-feira, 27 de abril de 2010

Conversas de bar



Trinta e Cinco graus marcava o termômetro no Leblon. Um calor infernal reinava naquele verão, eram duas luas para cada um. Já que não tinha nenhuma programação naquele dia, resolvi ir ao Antonio's. Recinto tão famoso, que não poderia deixar de ser visitado.
Entro no recinto. O lugar estava pouco movimentado, também eram apenas 3:00 da tarde e o bar começava a fervilhar lá pelas 5 da tarde. Escolho uma mesa bem no fundo. Peço uma dose de uísque e fico a ver aquele lugar tão saudosista. Fotos, mesas, cadeiras, tudo me remete à lembranças tão boas de coisas que nem vivi, mas que conheço bem.
Quando dou por mim, um senhor de cabelo branco, um pouco calvo, com um copo de uísque empunhado,vestido com uma camisa branca aberta nos primeiros botões e calças brancas, estava na minha mesa. Logo dei por mim, quem seria tão glorioso ser. Não é possível, acho que estou bêbado.
- É caraii, desde cedo você já sabe o que é bom - apontando para o copo que acabara de chegar. O uísque é o melhor amigo do homem.
- Você não é o...
- Shhhhhh - fazendo gestos para eu ficar quieto. Esquece isso ai, vamos trocar um lero e aproveitar o momento.
Eu atonito, não sabia o que fazer. Logo Ele, estava na minha frente. O meu mestre, o cara que sempre admirei. Só não entendia o que ele estava fazendo lá, já que há anos ele não compartilhava esse verão escaldande do Rio.
- Mas, pera lá. Como você está aqui se...
- Cacete, como você fala o desnecessário. Poh, vamos conversar de coisas mais interessantes.
- Tudo bem...
- Primeiro, queria saber que cara é essa? Cara de desanimado, rapaz.
É, Ele já tinha reparado. Grande é a minha fraqueza por mulheres. E mais uma acertou o meu peito tão fulminante como um choque de um cometa num planeta desse universo gigantesco. Não parava de pensar nela. Mesmo sabendo das peças que a vida me pregou, ela fora a última. Mas nenhuma mexeu tanto quanto este pequeno ser de curvas perigosas. Só de lembrar os seus cabelos ao vento, o seu olhar cerrado encarando-me, seus lábios doces. Ela é o meu desatino.
- Sabe como é... Você sabe muito bem como uma mulher mexe conosco.
- Oh... Já sofri, me apaixonei, briguei, casei, com mais de 9. Sou estudado nisso, poh.
E soltou uma laarga risada. O pior de tudo que não acreditava que ele estava na minha frente.
- Pior que é mesmo, neh. Elas tem uma capacidade de tirar o nosso norte, mexer com nossos mais escondidos sentimentos. São piores que o demo.
- Mah, calma carai. Se as mulheres são o demo, nós somos os seus mais fiéis capetinhas. Gostamos de estar ao lado delas, e principalmente amá-las.
- Eu não tenho mais paciência para isso, to cansado de sofrer por mulher que não me ama!
Depois disso, dei um soco na mesa, e bebi de uma vez o copo de uísque. Fiz uma careta esquisita, já que não era muito conhecido do amigo Dele. O meu caro amigo, depois de ver tão cena estapafúrdia, deu mais uma das suas risadas.
- Meu jovem, você tem muito o que aprender. Para nós, amantes intensos, isso é uma consequência por sermos assim. Não são todas que gostam da gente. Quem sabe, se com essa sua cara feia, essa tristeza, você pode estar afastando outras pessoas fantásticas de você. Ou até mesmo, você está afastando ela. Tem coisa mais importante pra se preocupar, poorra..
- Como coisa mais importante pra me preocupar? Minha felicidade não é importante?
- É claro que ela é importante. Mas ela virá na hora certa. Não brade aos quatro cantos que é infeliz, relaxe um pouco. Afinal de contas,você está no Rio de Janeiro!!!
Logo após essas palavras, acalmei-me. Meu coração estava amparado, uma calma quase angelical tomou posse de mim. Até que ele tinha razão!
- Poxa, bem que você tem razão.
- Novidade... Eu sempre tenho, poorra. Vamos escrever uma música para comemorar, então esse encontro que o destino nos proporcionou.
E tirou um papel e uma caneta do bolso.
- Poxa, mas eu não tenho nem metade do seu talento.
- Vai te catar, e me ajuda aqui, carai...
Ficamos horas escrevendo a música. Além de gargalharmos, falarmos das belezas do Rio, conversamos mais sobre mulheres e outros assuntos. Nunca conversei com tal pessoa tão interessante quanto Ele.
A música estava pronta. Peguei o papel, li e reli aquela obra que acabamos de fazer. Não acreditava que acabara de compor algo com Ele.
- Caramba, isso ficou magnífico Viníc...
Mal acabei de falar, e reparei que não havia mais ninguém na minha frente. Olhei para os lados, fui ao banheiro ver se estava lá, nada. Voltando a minha mesa, vi que o seu copo ainda estava lá, apenas com as pedras de gelo, junto com a nossoa composição . Dei um leve sorriso, e guardei a composição no bolso esquerdo da minha calça.
Já pagado a conta, fiquei na porta do estabelecimento olhando o movimento. Aquele clima indescrítivel no Leblon, as pessoas passando, o céu começando a entardecer, todos os componentes estavam alinhados para compor esse dia perfeito. Vinícius teve um paraíso aos seus pés, onde ele usou e abusou para suas inspirações.
Minutos depois, passa uma morenaça de parar o trânsito. Curvas de violão, cabelos negros como a noite, olhos verdes como de uma pedra preciosa e pele tão sedosa que me arrepia só de lembrar. Vendo o seu gingado se perder no horizonte da rua pensei: "Essa era do tipo que o Vinícius gostava". E fui me embora, feliz e recitando os famosos versos de Vinícius:
"Afastai-me os olhos da mulher morena..."

Homenagem ao meu grande ídolo, o Poetinha, Vinícius de Moraes.

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